terça-feira, março 29

DOS LEITORES

in Público 26/03/05 (2)

É lúgubre

Vasco Pulido Valente

Apareceu em cena um novo grupo com o propósito pouco original de salvar a Pátria e "refundar" a direita, neste caso o PSD. O chefe é o miraculado António Borges (que Deus salvou de um desastre de avião para nosso futuro gozo e benefício) e os comparsas já anunciados Leonor Beleza, Rui Rio, Aguiar Branco, Jorge Bleck (quem?...), Silveira Botelho e Alexandre Relvas. Como de costume, o chefe foi à televisão (à RTP, evidentemente) dizer de sua justiça e, como de costume, não tinha nada a dizer. Tudo espremido, Borges não passou da velha panaceia liberal, mil vezes repetida desde Thatcher e Reagan: reduzir o Estado, baixar impostos, privatizar e desregular. Falou também na "integridade" da política e no espírito de serviço público, duas baboseiras sem sentido, que ele piedosamente toma a sério. Se ele quer de facto, e jurou que sim, "discutir ideias", tem de arranjar primeiro meia dúzia delas.O mal disto não é o exercício em si, que de resto a lei garante e protege. O mal é a espécie de indivíduos que hoje sentem em si próprios a irresistível vocação de nos pastorear. De onde vêm eles? Que tradições representam? Quem os recomenda e apoia fora do pequeno mundo em que circulam? Ninguém sabe. Aconteceu o mesmo com o Compromisso Portugal e o Portugal Positivo. Um certo sucesso, uma certa competência e muita "modernidade" saloia chegaram para convencer personagens dolorosamente modestas da sua importância e lucidez. Para governar bem, julgam elas, basta aplicar as boas regras, como qualquer gestor em qualquer empresa ou em qualquer país "competitivo". A suspeita de que há uma diferença entre Portugal e a Irlanda ou, por exemplo, a Goldman Sachs não penetra, nem pode penetrar, naquelas cabeças. Embora substancialmente melhor e com uma vida que de Boliqueime a São Bento lhe ensinou muita coisa, Cavaco inaugurou a estirpe dos políticos que não conheciam Portugal: a história, a sociedade, a cultura. Estes de agora só vão até ontem. Antes de Cavaco o país não existia e hoje só existe como abstracção estatística. Daí a presunção absurda de que ele é uma massa moldável, a que basta aplicar as pressões convenientes, com o indispensável complemento de optimismo e fé: o famoso "acreditar em nós" tão útil no futebol e na economia. Não se consegue imaginar indigência mental mais devastadora e lúgubre. Mas com certeza o PSD vai gostar.

1 Comentários:

Às 10:34 da manhã , Anonymous Anónimo disse...

Lendo o artigo de Vasco P Valente, temos de chegar à realidade:
Todos diferentes (?) todos iguais...
Mudem os nomes às personagens e ao partido, deixem cair o "D", por exemplo.

 

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