terça-feira, janeiro 11

ARTIGO PUBLICADO NO PRIMEIRO DE JANEIRO, EM 4/1/2004

MOSCARDEIRO


UM FUTURO DE PAZ


A Paz não é só a ausência da guerra, diz-se, e com razão. Porque a Paz substantiva-se na Justiça e, mais que na solidariedade, na fraternidade entre os homens e as mulheres que constituem este Planeta Azul. É o encontro de todos os homens de boa vontade, na prossecução do Bem – Comum.

Um dos mais importantes acontecimentos na (re)construção da Paz aconteceu em Lisboa, por iniciativa da dinâmica Comunidade Taizé (França), que reúne monges de várias latitudes e designações cristãs, e onde mais de quarenta mil jovens se comprometeram na luta pela Paz. Na proclamação final deste encontro, os participantes consideraram que "inúmeros são aqueles que aspiram hoje a um futuro de paz, a uma humanidade livre das sombras da violência. Se há quem, tomado pela inquietação face a um tempo incerto, se quede ainda imobilizado, há também, por todo o mundo, jovens cheios de vigor e de criatividade".

E continuando, afirmam os jovens participantes, que tomaram por sua a Carta Taizé deste ano, "não se deixam arrastar por uma espiral de melancolia" e "estão conscientes disto: o que pode paralisar o ser humano é o cepticismo ou o desânimo. Assim, procuram com toda a sua alma, preparar um futuro de paz e não de infelicidade. Mais até do que supõem, eles conseguem já fazer de suas vidas uma luz que ilumina tudo à sua volta".

Este encontro, que infelizmente não teve a cobertura merecida por parte da comunicação social portuguesa, foi um sinal de que "a paz e a confiança" são levadas "aonde existem perturbações e antagonismos e perseveram quando as contrariedades e as provocações pesam sobre os seus ombros (dos participantes)". Significa que "simplificar a vida permite partilhar com os mais carenciados, de forma a aliviar a dor, onde quer que exista doença, pobreza, fome…", e reconhecendo ser verdade que "ao longo da história, os cristãos conheceram múltiplos abalos: surgiram separações entre os que, afinal, se referiam ao mesmo Deus de amor", completam afirmando que "restabelecer a comunhão é hoje urgente, não se pode adiar permanentemente até ao fim dos tempos".

Ao mesmo tempo que estas lúcidas palavras eram proferidas, contavam-se as centenas de milhares de mortos, feridos e desalojados no Sudoeste Asiático. Toda a Comunidade Internacional se mobiliza (os Estados Unidos empurrados, numa primeira ajuda "ofereciam" um décimo do que gastam por dia na Guerra do Iraque!) para acorrer à catástrofe "natural".

Curiosos estes dois acontecimentos, que me levaram a reflectir sobre a Paz que as mulheres e os homens têm neste Planeta, chamado Terra. Quantas bombas atómicas são ensaiadas nos desertos e oceanos, quando os mesmos que as lançam são os que colocam as bandeiras a meia haste ? Quantas feridas causamos ao Planeta e depois choramos as consequências dos nossos actos? Quantas florestas dizimadas? Quanta morte infligimos, com a resistência ao cumprimento do Protocolo de Quioto? E poderíamos continuar, porque afinal as catástrofes "naturais" são da nossa responsabilidade, porque não estamos em Paz com a Natureza.

A ganância de uns poucos, que dominam o mundo, contrapõe-se à luta que aqueles milhares de jovens em Lisboa, e muitos milhões no mundo, encetam. Fazedores da Paz, na reconciliação ecuménica, que também é urgente com a Criação. E nós somos, também, concriadores, temos imensas responsabilidades !

E agora, aterremos na Maia e pensemos no desordenamento territorial, nas machadadas que infligimos à Paz com a Criação, nos nossos rios e ribeiras, nos lençóis freáticos contaminados, nas construções desenfreadas, nas manchas verdes substituídas por zonas industriais descontroladas, no arranque das árvores, nos resíduos e seu tratamento, nos planeamentos estratégicos sem rumo, no ateísmo e indiferença das populações, que não ousam o protesto legítimo e desobediência cívica contra a morte que os vários poderes, também os políticos, levam a estas Terras do Lidador.

Encontro de Lisboa e a Morte no Sudoeste Asiático, mais que uma reflexão impelem-nos à acção, neste microcosmos que é a Maia, inserida na Área Metropolitana do Porto e como cidadãos e cidadãs de corpo inteiro, não vamos deixar que os responsáveis político-económicos que ‘tratam’ das nossas vidas coloquem as "centrais de interesses" à frente da vida humana. Participar activamente é a palavra de ordem, para que se não chore depois, com lágrimas de crocodilo.

Joaquim Armindo
Deputado Municipal do PS
jarmindo@clix.pt
www.bemcomum.blogspot.com

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