terça-feira, janeiro 3

ARTIGO PUBLICADO NO PRIMEIRO DE JANEIRO

Na última terça-feira foi publicado no Jornal O Primeiro de Janeiro, um artigo da autoria de Joaquim Armindo:

MOSCADEIRO

UM VOTO POLÍTICO

Nunca desde que voto, só após o 25 de Abril, esse dever de cidadania deixou de ser tão só partidário. Voto de acordo com a minha consciência política, e penso mesmo que com cada eleitor se deveria passar o mesmo. As campanhas eleitorais têm servido para adormecer as consciências, das lembranças do que foram e são muitos daqueles que se candidatam, e o que fizeram, que levou ao descrédito do sistema democrático, porque assim agindo podem facilmente manobrar, aparecendo em “folclores”, de beijos e abraços, prometendo tudo a todos, e o que é verdade esquecendo-se logo no dia seguinte. É uma realidade que quando a política não é séria, toda a sociedade a coloca como resíduo, não reutilizável e manda-a para aterro, novo nome das lixeiras, embora, como na política, mais aprazíveis de mostrar ao público.

Um voto político de consciência, pode não o útil, mas é aquele que cataliza as esperanças, porque são vozes que, embora clamando, às vezes, no deserto, fazem-se protagonistas duma história a construir no futuro. Não é de hoje que estas vozes assumem um carácter profético, de que a maioria desconfia, se não está bem informada e formada. Os profetas, contudo, são sempre desprezados nas suas próprias terras e banidos, para que à frente se lhes dê a razão, que sempre tiveram. Hoje, como outrora, existem mulheres e homens de boa fé, que acreditam na possibilidade de construir um mundo onde as pessoas tenham a dignidade que merecem, onde aqueles que não têm vez, nem voz, hoje, possam ser, também actores dos destinos das comunidades dos povos livres. Vamos levar algum tempo a interiorizar estas questões, mas deixar nas mãos dos políticos, aqueles que aparecem com máquinas sabiamente montadas, profissionais ou candidatos à profissionalização, sem que a nossa participação seja activa em todos os períodos da vida, é um erro, porque ninguém pode governar bem, sem a nossa participação activa, nos variados níveis, nem os países podem sair das mordaças que lhes impingem se assim não for. É um erro estrutural na política, clamar pelos votos sem existir uma prática consistente, aclamadora ou denunciadora, dos cidadãos da polis; será como ignorar que o nosso destino comum está nas nossas mãos, e não de outros. Todos sim, alguns não!

E isto tudo a propósito da campanha eleitoral, intoxicante, que já percebemos estar montada para as eleições do Presidente da República. Todos correm a saudar a populaça, agora factor determinante, mas amanhã esquecido, porque é assim que as pessoas querem, e se sentem bem, sem acordar do sono profundo em que se mantêm desde que a ditadura de Salazar mandou “disciplinar” os discordantes, actuando de forma que o dever de cidadania fosse caldeado pelas mocidades ou legião portuguesas,

imitando os chefes alemão e italiano. Agora, presentia-se a aragem de sermos os únicos a decidir o presente e o futuro, quando uma nova clientela invadiu o país, e fez depender esse futuro colectivo de meras eleições, que querem os votos, mas não a participação. E isto é mau, mesmo muito mau. Há que repensar toda a forma de actuação, e em vez de votos em elegantes estátuas estáticas ou falantes, os colocar nas urnas com a consciência de que todos somos políticos, e os movimentos dos cidadãos são vozes tão autorizadas como a organização em partidos políticos. E isso os partidos têm de compreender, que não são eles a mandar, e os movimentos cívicos a convencer-se da sua imprescindível actuação. É muito salutar para qualquer poder político situado, saber que pode contar com a participação de movimentos, nas mais diversas áreas, que com as suas actuações só ajudam o poder.

Das candidaturas apresentadas à presidência da República, existem diferenças que convém, desde já, começar a discernir, aquelas que não têm medo dos cidadãos, enquanto interventores, e as outras que provêm de poderes instituídos, de máquinas manipuladoras e sem perspectivas, que não sejam “dar” os brindes das campanhas, gastando o dinheiro dos contribuintes. A memória não é assim tão curta no nosso povo, que não dê para esquecer o passado, e nessa, na sabedoria popular, confiamos. Um dos candidatos, antigo primeiro ministro, é bem conhecido pela arrogância de ser Professor, e do cimo do estrado falar aos incautos, que sem perceberem, porventura apoiam, numa azafama de festim, com bobos da corte e tudo o mais. Quem não se lembra do Prof. Cavaco Silva e da sua incapacidade para o diálogo, para olhar para as pessoas para além dos números que enfadonhamente refere, e que nada trouxe ao país de moderno e de novo? Quem não se lembra das afáveis campanhas de Mário Soares, e não veja nesta o mesmo estilo, a mesma comunicação, a mesma determinação de nada ir fazer de novo?

Mas eis que aparece um homem, que não é o salvador da pátria, nem quer ser, que começa a colocar o discurso político nas mãos dos cidadãos livres, sendo o único que poderá romper com os circuitos fechados e enfadonhos da discussão política. Vem sim inaugurar um novo conceito de utopia, que realiza a realidade e trás na cultura a génese, de incluir na sua intervenção a construção de um novo modo de ser e estar na política. É inconformado, como os seus poemas, mas determinativo nas opções de colocar os cidadãos como epicentro da história.

Chama-se Manuel Alegre, e é ele que apoio, porque sei da sua sinceridade, e porque o meu voto sempre foi político.

Joaquim Armindo

Membro da Comissão Política do PS/Maia

jarmindo@cilx.pt

http://www.bemcomum.com

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