terça-feira, dezembro 14

INTERVENÇÃO DOS LEITORES

Premonitório ou não?!

Um texto de Pacheco Pereira, publicado antes da queda do Governo , mas que se mantêm actualíssimo:

É bem feito.
Os sinais estavam lá.
As novelas. As intermináveis e desconchavadas novelas em que todas crianças frequentam colégios caros da Linha e são louras e precocemente parolas.
As Lux e as Flash. O telejornal da TVI.
O futebolês e a sua miríade de constelações e estrelas, as maiores, as menores e as anãs, os dirigentes, os agentes, os jogadores, as transferências e os treinadores de bancada e de café.
O 24 Horas e as suas manchetes sanguíneas e colunas rosa-choque.
Os três diários desportivos.
Os Big Brother's e as chusmas de indigentes que revelaram, geraram e adularam.
Os caciques locais.
Marco de Canaveses.
A justiça, apoucada e achincalhada.
A Alexandra Solnado e as conversas de Jesus com a cabritinha.
As abstenções, galopantes.
A política, trauliteira e lapuz.
Os impropérios lançados a esmo, pelos carroceiros e pelas azémolas que habitam o Parlamento e as autarquias deste país de norte a sul.
Os deputados que o são apenas porque dominam as concelhias e os aparelhos partidários .
O triunfo da demagogia, a vitória fácil do populismo.
A farsa da Madeira, esse espectáculo pornográfico instalado há anos na Casa Vigia, onde perora um senhor anti-democrata e fascista, adulado por um dos dois maiores partidos portugueses.
A lenta agonia da Cultura.
A asfixia da Ciência.
A sangria, continuada, mortal, dos nossos melhores homens e mulheres, em demanda de melhores países, de outras instituições que os animem, que os reconheçam.
A invasão especulativamente obscena do betão por todo o lado.
As oportunidades perdidas.
O Alqueva.
Os fundos de Coesão.
O Fundo Social Europeu.
Os subsídios à agricultura dados de mão beijada a pessoas que não sabem distinguir um cão de uma ovelha.
Os jipes.
Os condomínios privados.
Os montes no Alentejo.
As férias no Brasil e as festas no Algarve.
Os milhares que provam, provado, o adágio que diz que quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vem.
Os Ferraris do Vale do Ave, Covilhã, Leiria, Cascais e Figueira da Foz .
Os processos que prescreveram.
Os jornais, as rádios, as revistas, as televisões que estão na mão de apenas três grandes grupos económicos.
As campanhas eleitorais, pagas a peso de ouro, a troco não se sabe bem do quê. As negociatas. As promessas.
As mentiras.
Os impostos que iriam descer e afinal sobem.
O emprego que iria subir e afinal desce.
O IVA que já foi a 17% e agora é a 19%.
O Santana Lopes que passou do Sporting para a Figueira, da Figueira para Lisboa e de todas as vezes foi eleito. Democraticamente. E que foi alçado a número dois do PSD estando, por esse facto, na linha de sucessão para o cargo de primeiro-ministro. E, quando tudo isso aconteceu, onde estávamos nós? Na praia? No café?
A Ler Devagar, a folhear Heidegger? Em Londres, a admirar Buckingham Palace?
Não sei onde estávamos. Sei, apenas, que estávamos calados. E é por isso que é bem feito.
Demitimo-nos do dever de falar, de esclarecer, de protestar, de votar.
E, se alguns, poucos, falavam, muitos assobiavam para o ar, como se não fosse nada connosco. Era sempre com eles, com os políticos.
E estávamos errados: a política é nossa. A política somos nós que a devemos fazer, participando, votando, reclamando, exigindo.
Abstivemo-nos e as coisas aconteceram.
Os factos surgiram e ficaram impunes.
Os acontecimentos seguiram o seu curso, o barco singrou desgovernado, com os incapazes ao leme e os arrivistas a bater palmas.
Agora que o impensável se acastela no horizonte, assim ficamos, aflitos, o coração nas mãos, a perguntarmo-nos: como foi possível? Como será possível?
E mais aflitos ainda ficamos porque sabemos: é possível. Pode acontecer.
Pode acontecer que Paulo Portas e Santana Lopes, dois parasitas do poder, dois demagogos, dois populistas, se enquistem em São Bento.
Mesmo as eleições antecipadas, a ocorrer, poderão não o impedir.
Mais: as eleições poderão até ser o impulso que necessita essa associação simbiótica contra-natura para se declarar vitoriosa.
Bastam uma fotografias nas revistas do coração, uns beijinhos nalgumas feiras, uns ósculos nalgumas recepções, três ou quatro discursos ocos, cheios de sonoridade e de impacto televisivo, a aura de salvadores da pátria e dos bons costumes, e lá vai o povinho do futebol, dos morangos com açúcar e do 24 horas a correr às urnas, ungir o Sr. Feliz e o Sr. Contente com os louros do poder.
E, mesmo que não aconteçam eleições, a cartilha está igualmente traçada.
Os impostos a cair.
As festas para o povo pagas com o erário público, esse erário minguante que à custa de tanto e de tantos foi custosamente aforrado nos dois últimos anos. As promoções em catadupa, os Institutos Estatais criados por decreto, para promover os novos boys e criar novos empregos efémeros.
Os gastos à tripa forra para contentar taxistas, peixeiras, senhorios, comerciantes e banqueiros.
Os saneamentos políticos. A ostracização dos críticos, dos descontentes, dos que se manifestam.
Tudo isto pode acontecer.
Não só por dois anos, mas também por quatro. Ou mais.
Até que o dinheiro se acabe ou até que vague o cargo de Presidente de qualquer coisa.
Que até pode ser o do País, que a malta nem se importa muito.
" Afinal, os povos cobardes só têm aquilo que merecem !.... "



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