terça-feira, julho 12

ARTIGO PUBLICADO NO PRIMEIRO DE JANEIRO

Artigo publicado no Jornal O Primeiro de Janeiro, da minha autoria, em 5/7/2005:
MOSCADEIRO


CEMITÉRIOS: CORAGEM CULTURAL E POLITICA


Em Portugal, como aliás em todo o mundo, existem práticas culturais de enterramento dos seus mortos, que nem sempre estarão de acordo com a defesa do meio ambiente, e consequente eliminação dos pontos mais poluentes.

Os cemitérios constituem hoje locais de poluição ambiental muito salientes, quer a nível do aquífero freático, quer do ar, pelas contaminações que produzem a decomposição dos corpos. Até aqui, a formulação da tese, parece que todos estaremos de acordo, agora colocar esta questão às populações, levando-as a outras soluções possíveis, é que os políticos autárquicos, nomeadamente as Juntas de Freguesia e Câmaras Municipais, temem, porque se trata, certamente, de votos perdidos, do politicamente incorrecto, mas que não deixa de ser premente nos planos eleitorais, e, consequentemente, nos projecto dos governos locais.

Não existe no nosso País legislação que obrigue ao licenciamento ambiental dos locais reservados a cemitérios, ou até ao alargamento daqueles que já existem, e a legislação existente, de acordo com o Prof. Alberto Pacheco, em artigo técnico, na revista “Tecnologias do Ambiente”, é claramente insuficiente, para não dizer caduca, o Decreto n.º 44.220, de 3 de Março de 1962, alterado pelo Decreto n.º 45.864. de 12 de Agosto de 1964.

E porque não existe, passa a ser um problema político, a, que, diga-se, se quer sempre passar ao lado, dadas as inconveniências culturais do nosso povo, habituado a proceder com os seus familiares quando falecidos, de determinada maneira. Seria, por isso, não violentando as consciências, de actuar no sentido do esclarecimento e de fomentar hábitos numa outra direcção. E há que possuir a coragem política para tal!

A inumação em sepulturas na qual o caixão é colocado, directamente no solo, é a prática cultural corrente, o que, de facto, produz riscos ambientais assinaláveis: para os lençóis freáticos e para o ar que todos respiramos. Um cemitério normal, e todos os alargamentos que estão a sofrer, são assim, não um jardim onde possamos, justamente, honrar aqueles que nos precederam, mas locais de risco elevado para o ambiente e saúde pública. A infiltração de micro organismos transmissora de doenças, como bactérias e vírus, que mercê da infiltração de águas superficiais, vão contaminar as águas subterrâneas, e logo as culturas e os poços e furos, e constituir sérios riscos para a saúde; por outro lado, os efluentes gasosos, derivados da decomposição dos corpos, penetram através das terras e poluem o ar que todos respiramos, constituindo um foco tremendamente poluidor.

Os Decretos referidos, com mais de quarenta anos de existência, não dão resposta cabal ao problema, se bem que no seu articulado refiram as cláusulas, para o tempo, consideradas necessárias: o declive dos terrenos, a permeabilidade dos solos, a drenagem necessária e a facilidade da escavação, o que de acordo com o técnico referido não constituem as melhores condições para a defesa das populações.

Esta questão é obviamente muito delicada, pois como já o disse, faz parte duma cultura fortemente enraizada, e tradição muito difícil de ultrapassar, e com toda a consciência o digo, melhor com todo o cuidado, não querendo ferir ninguém, porque as pessoas são únicas e merecem toda a dignidade como seres humanos.

Se escrevo sobre esta matéria, é pelo menos para alertar os políticos candidatos às eleições autárquicas, nomeadamente os da Maia, que não podem, porque não devem, escamotear esta questão nos seus programas eleitorais, antes terem ideias de como resolver a questão da falta de espaço, e existindo este não dar o problema por sanado. A cremação é uma oportunidade que não deverá ser desperdiçada, por exemplo.

Esta é uma questão eminentemente política, da coragem de colocar na prática da cidadania o problema frontalmente; com o cuidado devido, dirão os concorrentes, no que estou de acordo, mas não por motivo dos votos, mas por inerência da fragilidade cultural duma grande percentagem do nosso povo. Mas se isto é uma razão, não a é menos a poluição e a degradação da qualidade de vida das populações.

Esta é uma questão central para todos os autarcas, em todos os seus programas aparece sempre o cemitério, normalmente tendo em consideração o seu alargamento ou a venda de sepulturas, dando, assim, seguimento a uma postura cultural e política deplorável, quando o problema se deve centralizar no ponto de vista do ambiente e da saúde pública; não sei se algum dia existir a obrigatoriedade do licenciamento ambiental, para a instalação e funcionamento deste tipo de equipamento social, quantos estarão em condições de serem aprovados. É que os cemitérios são um risco potencial a controlar, para preservar o ambiente.

Aqui vai a minha reflexão, como contributo para os programas eleitorais, de quem, quase sempre, não está disposto a trazer ao de cima, questões incómodas.

Joaquim Armindo
Deputado Municipal do PS
jarmindo@clix.pt
www.bemcomum.blogspot.com

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