sexta-feira, dezembro 23

ARTIGO PUBLICADO NO PRIMEIRA MÃO

Artigo publicado no jornal Primeira Mão, de 16 de Dezembro de 2005


NOTAS SOBRE PRESIDENCIAIS

Já me chamaram a atenção de que não me pronunciava sobre as presidenciais. Agradeço a consideração, daqueles que me lêem, e tomam para si as minhas posições. Este é de facto um tema que, apesar de ser público, em quem voto, intriga muita gente, até pelo formato dos debates a que a TV nos está a habituar.

Aliás os media já elegeram quem são os candidatos, e até os finalistas, e disse que eram cinco (o que não é verdade!), silenciando que todos à partida são candidatos; é verdade que a grande maioria não passa sequer a candidato, por falta das assinaturas, mas todos podem querer vir a ser presidentes. Seleccionaram então cinco: Cavaco Silva (pelo PPD e CDS, embora se diga candidato apartidário...), Mário Soares (patrocinado pelo PS), Francisco Louçã (sustentado pelo Bloco de Esquerda), Jerónimo de Sousa (óbvio candidato do PCP e Verdes) e Manuel Alegre (baseado em militantes e dirigentes de muitos partidos), todos eles independentes, acima dos partidos, mas, excepto Manuel Alegre, contando com as sedes partidárias possíveis para os apoios necessários e suas máquinas sempre montadas, para o que der e vier. Agora já resumem os candidatos a dois, numa segunda volta, e colocam nomes (Cavaco Silva e Mário Soares), como um poder que se sobrepõe ao eleitoral, condiciona-o de forma, que não democrática, na tentativa de balizar as mentes das pessoas, no sentido de condicionar as suas livres opções. Sei que ninguém é uma ilha, nós todos vivemos numa aldeia global, e precisamos uns dos outros, mais devemos viver regulados, submetidos, por esta dependência, para que possamos ser felizes, mas o empacotamento das nossas mentes, dos nossos direitos de opção, que os poderes e interesses económicos possuem, e que dominam os meios principais de informação, proclamam, de forma claríssima, uma pseudo democracia baseada não na fraternidade e na discussão ética, mas nos valores dum liberalismo empolado e de populismo balofo.

Cavaco Silva, apoiado pela direita mais retrógrada, faz da economia a sua principal balança, preocupando-se com a macroeconomia, e não com os problemas reais das pessoas; aliás, o seu consulado de dez anos na chefia do governo é paradigmático do dramatismo de termos um professor ritmado ao lado desses interesses e resignado a um passadismo, que nada tem ver com uma cultura da economia. Existe, de facto, nas palavras do professor um tom de falar para colegiais (os votantes), de forma doutoral e de cima dos velhos estrados das escolas, dos cinquenta anos da ditadura. Talvez mesquinha vingança dos seus primórdios nos anos de aluno do ensino técnico-profissional (o Curso Geral de Comércio), que alguns media trocam por liceu... Não dormiria descansado com uma vitória do professor, nada confiando no seu tom hirto, e desapegado das pessoas e do seu ser. Qualquer mais atento, repara que o seu sorriso é fabricado, máscara imposta por assessores de imagem. As máquinas dos partidos apoiantes estão no terreno, mas os seus militantes e simpatizantes vão tendo medo deste doutor que contempla, sem o mínimo de sensibilidade social, os números numa crueza, que é realmente preocupante.

Mário Soares, tenho que dizer que nunca me entusiasmou, mas o percurso último dá-lhe características humanistas que embora sejam de considerar, não serão de todo sinceras. Não sou daqueles que vêm na idade o principal problema para, legitimamente, concorrer, mas creio que este “senador” teria melhor proveito como reserva moral e ética da sã social-democracia (o socialismo há anos que o meteu na gaveta...) e não enquanto novamente candidato. Apoiado pelo PS, enquanto partido, que colocou as suas sedes e máquina ao seu serviço, tem observado que nem sempre as cúpulas do Partido corresponde ao parecer e sentimento de muitos militantes, e ele sabe, não pode contar com todos. Tem, sobretudo, copiado campanhas eleitorais baseadas num populismo contagiante, e muitas poucas ideias, parecendo misturar o partido, com o governo e a presidência, somando uma certa arrogância (é-lhe inato!), até pela proposta de que o PS deveria requerer a “santa inquisição”, ao tentar forçar que Manuel Alegre se demita. E o partido, o PS, não é isto, como ele está farto de saber.

Jerónimo de Sousa e Francisco Louçã, são, claramente, candidatos colocados pelos partidos a que pertencem, para fazer passar a sua voz e medir terreno. De qualquer forma é boa a sua existência, dado que poderão questionar muitas coisas que outros não podem ou incomoda fazer. As máquinas funcionam, em nome duma unicidade partidária, mas podem ter desilusões quantos aos resultados. São apoiados por muitos descontentes, que vêm nos partidos concorrentes e pessoas “mais do mesmo”, e com uma certa razão. Fazem bem em participar, proclamar os seus ideais, e fazer da campanha uma mais animada discussão.

Manuel Alegre, que congrega grandes franjas do PS, aparece defendendo um projecto interventivo e novo, capaz de galvanizar a esquerda para os grandes desígnios nacionais, e colocando pela primeira vez o primado das pessoas acima dos interesses, sejam eles quais forem. A colocação da palavra pátria com um sentido de unidade no essencial, e não no pejorativo esquema de Salazar, é já uma animação, para quem quer ter o sentido da solidariedade e fraternidade, na resolução dos problemas. Manuel Alegre poderá perder, nas urnas, mas com seu arrojo que só os pensadores, os poetas detêm, já lançou uma nova forma de discussão, porque honesta civicamente, e chamou tantos arredados a darem a cara, o que fez parar de espanto e quiçá susto, muito boa gente habituada a se sentir segura. Uma candidatura singular.

Por isso, e pelo mais, voto Manuel Alegre.

Joaquim Armindo

Membro da Comissão Politica do PS da Maia

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